Desencontro

Procuro a calma aguardada pelos que temem e são oprimidos,
mas meu coração é catapulta,
e eu, impulso.
Chego tão alto que tudo encolhe e as nuvens são minha única companhia
Caio no mar,
ainda distante da civilização,
sinto a massagem oceânica,
e meu corpo automático enferruja.
Quem me dera uma correnteza destas que vai e que vem me pusesse na areia,
áspera e salgada.
Então, eu olharia para cima e veria moças bonitas que, se a sorte estivesse comigo, nunca viram um                                                                                                                                                    [homem de lata.
Não, você não pode!
Temos relatórios, laudas e projetos para entregar.
O nível de produtividade está abaixo da meta (a qual, sabemos, é inalcançável),
e a concorrência cresce e se aproxima (quando o mercado de sonhos não é competitivo?).

Saí daquele mundo de concreto armado (tive que descer pela escada e sair pela porta dos fundos, pois o elevador não chegava)]
Na rua, os sinais, todos fechados.
Eles provocam um trânsito barulhento.
Corro aonde há árvores e lembro que o mundo só tinha árvores
agora, ao ver os gigantes,
que abrigam tantos rebanhos.
e cingem, involuntariamente, nossa liberdade,
percebo que não somos diferentes da formigas afinal.
Ainda que, para elas, as únicas gotas venham do céu,
enquanto as nossas, de metralhadoras.

Como eu encontro calma 
se os juízes têm suas próprias leis,
se os hospitais carecem de leitos
e os mágicos são sinceros?
Eu oscilo entre máquina autômata e besta selvagem como o eletrocardiograma de um cardíaco
Meu peito ruge,
minha cabeça anseia
e minha alma clama
Todo meu corpo produz sentimentos e sensações artificiais aprendidos com filmes
e com o bisbilhotar de conversas.

Manso e humilde de coração,
feito Cristo,
já seria santo,
mas a fronteira que devo cruzar fica no horizonte.
Meus cavalos estão todos soltos,
e, com resistência e receio,
começo a caminhar.